O poder curador do perdão


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Simão, um fariseu proeminente, convidou Jesus para jantar em sua casa. Quando Jesus tomou lugar à mesa, uma mulher da cidade, prostituta, pegou um vaso cheio de perfume precioso, abraçou os pés do Senhor e, chorando, regava-os com suas lágrimas e os enxugava com os próprios cabelos; e também lhe beijava os pés e os lavava com o perfume. Diante dessa cena grotesca e inusitada, o fariseu anfitrião pensou consigo mesmo: “Se este fora profeta, bem saberia quem e qual é a mulher que lhe tocou, porque é pecadora”.
Jesus, percebendo a indiferença e censura do fariseu, lhe contou uma história: “Certo credor tinha dois devedores; um lhe devia quinhentos dinheiros, e o outro, cinquenta. Não tendo nenhum dos dois com que pagar, perdoou-lhes a ambos. Qual deles, portanto, o amará mais?”. Simão respondeu de pronto: “Suponho que aquele a quem mais perdoou”.
Jesus elogiou sua resposta e, voltando-se para a mulher, disse a Simão: “Vês esta mulher? Entrei em tua casa, e não me deste água para os pés; esta, porém, regou os meus pés com lágrimas e os enxugou com os seus cabelos. Não me deste um beijo; ela, entretanto, desde que entrei não cessa de me beijar os pés. Não me ungiste a cabeça com óleo, mas esta, com bálsamo, ungiu os meus pés. Por isso, te digo: perdoados lhe são os seus muitos pecados, porque ela muito amou; mas aquele a quem pouco se perdoa, pouco ama”. Jesus então se voltou para a mulher e lhe disse: “Perdoados são os teus pecados” (Lc 7.36-48).
Que cena! Ali estava uma mulher que precisava desesperadamente de perdão, e só lhe davam desprezo. Os líderes religiosos, os coronéis da esperança da época, só lhe imputavam juízo e condenação. Mas Jesus lhe estendeu a mão e, vendo que no seu coração ainda havia lugar para o amor, a perdoou de seus muitos pecados. Jesus sabia, e aquela mulher pecadora ficou sabendo, que o perdão cura a alma e abre a porta para expressarmos o amor de Deus na vida. Amada e perdoada, ela agora poderia também perdoar e amar.
Lembro-me que, por ocasião da guerra do Vietnã, uma foto em particular foi publicada em quase todos os jornais do mundo. Ela retratava uma garotinha fugindo aterrorizada de sua aldeia, juntamente com outros meninos, esperando escapar ao horror do Napalm que queimava sua pele. Ao fundo, um manto de fumaça e destruição. Seu nome é Kim Phuc. Nela ficaram as cicatrizes indeléveis em quase todo o corpo, como marcas do horror e da intolerância.
Em meados de 1996, Kim Phuc foi chamada para dar uma palestra em Washington, no Memorial dos Veteranos do Vietnã. Durante a palestra, ela disse que perdoaria o piloto que lhe infligiu tamanho dano, se um dia eles se encontrassem. O homem a quem ela se referia era John Plummer. Ele havia declarado estar certo de não haver civis morando na aldeia, por isso ordenara o ataque. Mas isso não fazia a menor diferença: sua culpa continuava latente e ele precisava se sentir perdoado.
O auditório estava lotado e, inacreditavelmente, John Plummer estava na plateia. Ele soube que Kim estaria lá, então foi para ouvi-la falar. Após a cerimônia, os dois se encontraram face-a-face, olhos-nos-olhos. Dois personagens antagônicos: ele é um americano que, no auge da guerra, quase a matou; ela é uma vietnamita que, quando o napalm começou a cair do avião dele, correu para salvar a própria vida.
Naquele momento, tudo o que John Plummer sabia dizer era: “Perdoe-me, eu sinto muito”. Constrangido, ele repetia a mesma frase. Kim Phuc o fitou por alguns momentos e respondeu: “Tudo bem, eu perdoo você”.
Como ela poderia perdoar o responsável por tamanho terror em sua vida? A resposta é que, após a guerra, Kim tornara-se uma seguidora de Jesus Cristo, assim também como John. Eles entendiam o perdão – como dá-lo e como recebê-lo. Eles foram perdoados por Jesus e, assim, permitiram que o amor de Deus em seus corações fizesse o ciclo do perdão continuar.
Kim Phuc era uma mulher que conhecia os princípios da fé cristã. Ela poderia ter ficado ressentida, como muitos o fazem, e odiado seu ofensor. Poderia ter desenvolvido um espírito amargo e vingativo. Poderia ter carregado uma raiva inflamada desse incidente cruel que marcara sua vida para sempre. Mas ela estava seguindo as ordens de Jesus: “Amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem” (Mt 5.44); e também: “Não condeneis e não sereis condenados; perdoai e sereis perdoados” (Lc 6.37). Ela sabia que fora totalmente perdoada por Deus, e podia orar: “Perdoa-nos os nossos pecados, pois também nós perdoamos a todo o que nos deve” (Lc 11.4). Assim, Kim Phuc perdoou o seu antigo algoz John Plummer e ministrou perdão ao seu coração carregado de culpa, abrindo a porta para o amor fluir.
Num mundo onde a retaliação é comum, somos chamados a amar e perdoar. Os princípios de Jesus são extremamente desafiadores, e isso não é fácil para ninguém. Mas, com a ajuda do Senhor, podemos seguir este conselho: “Suportai-vos uns aos outros, perdoai-vos mutuamente, caso alguém tenha motivo de queixa contra outrem. Assim como o Senhor vos perdoou, assim também perdoai vós” (Cl 3.13). Portanto, libere o poder curador do perdão e abra a porta para o amor de Deus fluir através de você e de quem mais você perdoar.

 

Samuel Câmara

Pastor da Assembleia de Deus em Belém

E-mail: samuelcamara@boasnovas.tv