Misericórdia e Graça

pr_samuel

Os conceitos de misericórdia e graça são não somente intrigantes, posto que alheios ao comportamento normal dos seres humanos, mas também abençoadores, pois ajudam no entendimento do caráter de Deus e de sua bondade imanente. Misericórdia é quando Deus não nos dá o mal que merecemos. Graça é quando Deus nos concede o bem que não merecemos. São como os dois lados de uma moeda, geralmente andam de mãos dadas, pois quase sempre o exercício de um demanda a aplicação do outro. Graça e misericórdia são fruto da bondade de Deus, são a essência do Evangelho de Jesus Cristo; e é isso que torna o Evangelho superior a toda e qualquer religião.

Lembro-me que, numa conferência de líderes cristãos, foi colocada em discussão essa questão crucial: o que diferencia o cristianismo de todas as outras religiões do mundo? Alguns dos participantes argumentaram que o cristianismo é único por ensinar que Deus se fez homem. Mas alguém objetou, dizendo que outras religiões ensinam doutrinas semelhantes. Quando trataram da ressurreição como forte diferencial, alguém afirmou que outras religiões acreditam que os mortos retornarão à vida.

A discussão tornou-se acalorada, quando chegou ao local, embora um pouco atrasado, o famoso escritor C. S. Lewis, autor de As Crônicas de Nárnia e outros clássicos. Lewis perguntou: “O que está acontecendo?”. Ao descobrir que a discussão versava sobre o que tornava o cristianismo tão singular, ele fez uma afirmação simples e direta: “Ora, isto é fácil! É a graça”. Lewis entendia graça e misericórdia como conceitos homólogos: equivalentes, correspondentes, embora mais ou menos diversos.

A discussão acabou ali mesmo. C. S. Lewis estava absolutamente certo! Sendo que a graça ocorre quando Deus nos dá o bem que não merecemos, ela significa, em suma, o “favor imerecido” que recebemos da parte de Deus. O próprio coração do Evangelho de Jesus Cristo é a suprema verdade de que Deus nos aceita incondicionalmente quando colocamos a nossa fé e confiança no sacrifício expiatório do Filho de Deus, que se tornou carne “e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade” (Jo 1.14).

Desse modo, o grande diferencial do cristianismo é o Evangelho (as boas novas) da graça e misericórdia de Deus. Muito embora sejamos pecadores sem esperança, o próprio Deus, em Sua infinita graça e misericórdia, nos perdoa completamente quando aceitamos pela fé o sacrifício de Jesus na cruz do Calvário. É por Sua maravilhosa graça e misericórdia que somos salvos, não porque sejamos bonzinhos ou tenhamos praticado boas ações, nem tampouco porque tenhamos frequentado igreja ou por seguirmos regulamentos religiosos.

Há quem se recuse a acreditar que seus pecados possam ser perdoados, e diz: “Deus não iria querer alguém como eu”. Esse tipo de pessoa tem uma sensibilidade latente, tem o conhecimento da mancha de sua conduta moral, mas falha em não perceber a maravilha da graça e da misericórdia de Deus, que são muito maiores que o seu próprio pecado (Rm 5.20).

De fato, não é fácil compreender totalmente a graça e a misericórdia de Deus. O problema é que nós sempre queremos fazer alguma coisa para agradar a Deus e nos tornarmos aceitáveis. Por isso o ser humano cria religiões. O caminho da religião é “passar um verniz” reformador na pessoa. A vida de uma pessoa religiosa se torna uma sucessão de regras e cobranças que, se cumpridas, pretendem garantir o favor de Deus.

O plano de Deus é totalmente diferente. Sua essência é centrada em graça e misericórdia transformadoras que a pessoa recebe pela fé em Cristo, pelo que Jesus realizou, não pelo que alguém possa fazer para merecer algo da parte de Deus. A graça só é graça porque é favor imerecido. A misericórdia só é misericórdia porque Deus desvia de nós o mal.

Se Deus fosse apenas misericordioso, não aplicando o mal que nós merecemos, isso poderia ter apenas o potencial de nos tornar irresponsáveis e de nos fazer permanecer irremediavelmente no mal. Se Deus fosse apenas gracioso, nos dando apenas o bem que não merecemos, isso teria apenas o condão de nos estragar como “filhos mimados”. Mas, juntas, graça e misericórdia têm o potencial de nos transformar e nos remeter a uma nova vida, nos levando a viver “de modo digno do Senhor, para o seu inteiro agrado, frutificando em toda boa obra e crescendo no pleno conhecimento de Deus” (Cl 1.10). O pecado pode ter nos deformado, mas a graça e a misericórdia de Deus nos possibilitam uma mudança essencial, isto é, uma transformação do próprio ser. Isso, e somente isso, é que nos torna aptos a permanecer na presença de Deus.

A maravilhosa graça de Deus está na pessoa de Cristo. A misericórdia de Deus, igualmente, está em Cristo. Só Jesus Cristo é o caminho que nos conduz ao Pai. Pelo Seu sacrifício na cruz, Jesus abriu “um novo e vivo caminho” para que, incluídos e transformados pela Sua misericórdia e graça, nos acheguemos a Deus com plena confiança de que somos completamente aceitos (Hb 10.20). Bendita Misericórdia! Maravilhosa graça!

 

Samuel Câmara

Pastor da Assembleia de Deus em Belém
E-mail: samuelcamara@boasnovas.tv