Nos idos de 1940, depois de um bombardeio dos nazistas sobre Londres, Mateus Sands recebeu um telegrama do Gabinete de Guerra britânico declarando que o filho dele, David, estava desaparecido e considerado morto. O relatório provou ser verdadeiro. Com o coração partido, Sands escreveu no verso do telegrama: “Tudo o que tenho e tudo o que sou, entrego-o a Deus para o Seu serviço”.
Pouco depois de tomar conhecimento da terrível notícia, Sands recebeu o telefonema de alguém com um lembrete sobre um compromisso importante. A caminho de seu compromisso, Sands passou por uma igreja antiga e abandonada e observou uma placa que dizia: “Para venda em leilão”. Ele entrou na igreja para orar, antes de prosseguir o seu caminho, e sentiu-se impulsionado a adquiri-la e restaurá-la como casa de culto. Sem que ele o soubesse, outro homem, Andres Jelks, que também tinha visto a placa, decidira comprar o prédio para transformá-lo numa galeria de diversões.
No dia do leilão, ambos compareceram. Mateus Sands havia preparado um documento com um lance formal pela propriedade, mas, em seu luto e estado mental confuso, entregou o telegrama do Gabinete de Guerra em lugar do lance.
O leiloeiro leu o telegrama em silêncio, bem como a mensagem de Sands escrita no verso dedicando a Deus tudo o que era e possuía. Finalmente, quando todos os lances haviam sido apresentados, ele anunciou que a igreja tinha sido vendida para Mateus Sands, que havia apresentado o lance mais alto. Quando perguntaram como, o leiloeiro leu as palavras no verso do telegrama. Os presentes, comovidos, concordaram com a decisão do leiloeiro.
Mateus Sands entendia que Deus exige dedicação total, não meio termo, não porções, não um pouco das nossas sobras, quer de tempo quer ou de recursos, como geralmente aponta o caminho da religiosidade com verniz humanista. Na verdade, para Deus, é “tudo ou nada”.
Isso ficou bem explicitado quando, certa feita, um dos escribas dos fariseus perguntou a Jesus: “Qual é o principal de todos os mandamentos?”.
A resposta de Jesus não deixou qualquer dúvida: “O principal é: Ouve, ó Israel, o Senhor, nosso Deus, é o único Senhor! Amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento e de toda a tua força” (Mc 12.28-30).
Isso é bem abrangente, pois compreende tudo o que temos e somos. Nada menos é aceitável. Isso quer dizer simplesmente que a natureza de nossa dedicação tem de partir de uma entrega total e absoluta de todo o nosso ser, com todo o nosso esforço consciente, na plenitude da razão e do compromisso de quem, por assim dizer, queimou todas as pontes porque não cogita jamais em retornar a qualquer padrão inferior ou menos exigente.
O que Jesus está a dizer difere totalmente do que os religiosos de sua época pregavam. Para Jesus não bastava dar coisas para Deus, quer fosse a sobra dos ricos ofertada sob o rufar de tambores e o tinir de clarins, ou a devoção religiosa estereotipada numa liturgia espalhafatosa para ser louvada pelos transeuntes admirados, tampouco os holocaustos oferecidos num culto onde os adoradores tinham a boca cheia de louvores, mas o seu coração se achava longe de Deus.
Para Jesus, não era a oferta que dava valor ao altar; era o altar que santificava e valorizava a oferta. E cada oferta, não importando seu tamanho ou valor, tinha de ser uma extensão do ofertante. E ambos tinham de estar santificados e dedicados integralmente a Deus.
E por que Deus quer que o amemos de todo o nosso coração? Ele mesmo responde: “Buscar-me-eis e me achareis quando me buscardes de todo o vosso coração” (Jr 29.13). É simples: Deus quer que o encontremos. E se lhe damos tudo, teremos Dele igualmente tudo. E se o amamos com a plenitude do nosso ser e esforço, também teremos da parte Dele a plenitude do Seu amor e bondade. Em outras palavras, Deus quer manter um relacionamento, não exercício de religiosidade; deseja ser nosso amigo, não nosso patrão; espera que andemos com ele, não que o visitemos num dia de culto; anseia por nos abençoar, não em responder às nossas barganhas; quer ser nosso Pai, não nosso padrasto; aguarda que confiemos Nele como nosso tudo, não como um utilitário divino para quando estamos atribulados.
Muitos cristãos, hoje em dia, vão à igreja toda semana, pensando que estão a adorar a Deus, mas tudo que eles querem é manter sua religiosidade e pedir que Deus abençoe suas vidinhas medíocres e os faça prosperar em tudo. Todavia, não têm o desejo de intimidade com o Senhor. Querem que o Pai celestial responda às suas orações, mas não desejam relacionamento com Ele. Não buscam a Sua face, não desejam ardentemente a Sua proximidade, não anseiam por Sua comunhão, simplesmente não têm vontade de permanecer em Sua presença, muito menos dar toda a sua vida a Ele.
Quando Jesus viu uma situação semelhante na adoração que o povo professava em seus dias, disse a esse respeito: “Bem profetizou Isaías a respeito de vós, hipócritas, como está escrito: Este povo honra-me com os lábios, mas o seu coração está longe de mim” (Mc 7.6).
Deus exige dedicação total. Só os voluntários de coração conseguem discernir e viver plenamente essa graça.
Samuel Câmara
Pastor da Assembleia de Deus em Belém
E-mail: samuelcamara@boasnovas.tv