Um cartaz lido por todos


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Um Juiz de Direito do estado americano de Ohio, em 2013, condenou Richard Dameron, 58 anos, a uma pena incomum: tinha de passar três horas por dia, durante uma semana, diante de uma delegacia de polícia segurando um cartaz de desculpas aos policiais, no qual ele dizia ser “um idiota ao telefonar e ameaçar de morte os policiais” pelo serviço de emergência 911. O mesmo juiz que o condenou já havia aplicado a estranha penalidade antes: forçou uma mulher a carregar um cartaz dizendo ser “uma idiota” depois que ela dirigiu pela calçada para desviar de um sinal de ‘Pare’.
Outro Juiz usava adesivos no carro de infratores como forma de encorajar a boa conduta ao volante. Ele dava duas opções às pessoas acusadas de dirigirem alcoolizadas. A primeira era colocar a seguinte mensagem no para-choque do veículo: “Este carro pertence a um motorista bêbado já condenado”. A segunda consistia em inscrever-se no programa de tratamento para alcoólatras. Quase todos os infratores preferiam a segunda opção, obviamente.
A obviedade da escolha indicava que maioria das pessoas preocupava-se bastante com o que os outros pensariam delas e queria manter uma boa imagem. Decerto, ninguém gostaria de ser pego e punido no contrapé de seu próprio mau comportamento, em vendo isto se tornar “publicidade” mundial pela internet. Em sã consciência, ninguém gostaria de ter publicamente exposta a deformidade de seu caráter e ser motivo de chacota dos outros.
Ah, com certeza, nenhuma pessoa de bom senso, ao ser flagrada num comportamento abjeto, gostaria de ser constrangida publicamente. Esse receio de constrangimentos se aplica também a muitos comportamentos inaceitáveis. Por exemplo, ninguém gostaria de andar por aí com uma placa nas costas com mensagens como:
“Fique atento: eu gosto de trapacear, mentir e trair as pessoas.”
“Tenha cuidado: sou dominado pela luxúria e não pelo amor.”
“Perigo: sou um cristão que não gosta de orar e ler a Bíblia.”
“Cuidado: sou um evangélico que adora fofocar e criar intrigas.”
“Atenção: não costumo cumprir a minha palavra.”
“Cautela: não preciso de eleitores; eu vou fraudar as eleições mesmo!”
“Pare! Não adiante protestar. Sou um político venal e pendo para quem pagar mais!”
“Preste atenção! Sou um cidadão que adora levar vantagem.”
“Hei! Sou um empresário corrupto e me juntei ao governo corrupto para roubar o povo, cometi o crime de lesa-pátria, roubei o futuro de seus filhos e netos!”
Basta de exemplos! É claro que se o Juiz Federal Sérgio Moro aplicasse esse tipo de pena aos apanhados e condenados na Operação Lava-Jato, tanto empresários como políticos, a turma de “humanistas” do “deixa-disso” faria uma gritaria geral, protestaria em nome dos “direitos humanos”, e talvez essa situação fosse invalidada por algum tribunal superior. Agora, pense se o Juiz fosse o próprio Deus, e Ele lhe designasse uma placa dessas! Há, portanto, uma pergunta que teima em não calar: se Deus, o Supremo Juiz, nos designasse tal placa, e decerto nenhum tribunal a invalidaria, o nosso interesse pessoal pelo respeito dos outros poderia de algum modo evitar que revelássemos a nossa verdadeira condição moral e espiritual?
A forma como respondemos a essa pergunta diz muito a respeito do nosso senso de dignidade diante de Deus e dos homens. O problema é que dignidade é um artigo raríssimo numa terra acostumada a ver tanta injustiça do poderoso contra o fraco; tanta frouxidão moral em nome do politicamente correto; tamanha apatia espiritual diante da banalização da vida; imensa roubalheira em nome de um projeto de poder; sobeja canalhice de quem se mete a cometer crimes e depois de apanhado se defende dizendo que “todo mundo faz”.
Falta dignidade. Isto porque falta decência, decoro, compostura, honradez, brio, pundonor. Falta exatamente o que gera a autoridade moral que se recusa a dobrar-se diante da injustiça. Falta precisamente o que produz a honestidade banhada de honra e respeitabilidade e que, por fim, faz nascer a autoridade cívica que enfrenta a desonra e a mentira dos subservientes a serviço do crime. Dignidade é também respeitar a si mesmo; é ter amor-próprio e decência; é agir pelo brio do caráter permanente, não pelo brilho do aplauso momentâneo.
Embora as pessoas nem sempre julguem de modo correto e calcadas em evidências, pois geralmente se baseiam nas aparências, uma coisa é certa: Deus sempre nos julga correta e justamente. Isto porque é Justo e também nos conhece perfeitamente. Sabedor disso, o apóstolo Pedro ensina: “Ora, se invocais como Pai aquele que, sem acepção de pessoas, julga segundo as obras de cada um, portai-vos com temor durante o tempo da vossa peregrinação” (1Pe 1.17).
É claro que a maioria das pessoas jamais levará um cartaz para apregoar seus malfeitos. No máximo o fazem para apoiar alguma causa, por exemplo, “pró” ou “contra” o impeachment. Porém, muito mais do que um “cartaz”, veremos enfim que somos nós mesmos as “cartas” abertas para serem lidas por todos. É isso que o apóstolo Paulo ensina sobre aos cristãos: “Vós sois a nossa carta, escrita em nosso coração, conhecida e lida por todos os homens” (2Co 3.2).
Em tempos de acirramentos e extremismos políticos de “nós contra eles”, em tempos de relaxamento moral e banalização da corrupção na vida pública nacional, é bom lembrar que a mensagem que cada cidadão passa num “cartaz público” aos demais é decorrente do conjunto de suas atitudes e ações, efetivadas na vida pública ou na vida privada que leva, as quais ficarão marcadas indelevelmente nos anais da eternidade perante o Justo Juiz. Isso deveria importar a cada pessoa, porque deste Tribunal ninguém jamais escapará.
Diante disso, cada cidadão terá de responder a essa pergunta incômoda: como “carta” lida normalmente por todos, ou evitando “cartaz” proposto pelo juiz, é possível que tema a opinião ou juízo de Deus menos do que temeria a opinião ou juízo dos outros?

Samuel Câmara

Pastor da Assembleia de Deus em Belém

E-mail: samuelcamara@boasnovas.tv